Eu já tinha ouvido falar do Curso da Felicidade de Yale, um apelido que a imprensa deu à série de aulas idealizada pela professora Laurie Santos, focada em como ciência pode ajudar a aumentar nosso bem-estar. Quando ministrado pela primeira vez (a única de forma presencial), com o nome “Psyc 157: Psychology and the Good Life”, em 2018, o curso atraiu mais de mil alunos, ocupando o maior auditório da universidade. Ganhou capas de revista e chamadas em sites, e foi quando eu pensei que queria saber mais a respeito, mas acabei deixando para depois. No mesmo ano, a versão online chegou à plataforma Coursera, na qual bateu recorde atrás de recorde. É o programa que atraiu maior número de inscrições na história de Yale, universidade fundada em 1701. Também ocupou o primeiro lugar no ranking de cursos com mais inscritos no Coursera ano passado, quando o ensino a distância experimentou um boom, impulsionado pelo isolamento social imposto pela pandemia.
Foi no meio da quarentena que decidi fazer as tais aulas para aprender a ser mais feliz. Apesar de o título despertar algum ceticismo, as credenciais da professora me atraíram. Diretora do Laboratório de Cognição Comparada de Yale, Laurie Santos é psicóloga e cientista cognitiva, com formação em Harvard, da graduação ao PhD. E, apesar de este detalhe não importar muito, não deixa de ser interessante: a professora Laurie foi uma das mulheres extraordinárias retratadas na campanha da Chanel para o aniversário do Perfume N°5, maior ícone da marca.
Mais de 3 milhões de pessoas em 170 países assistiram o curso criado e ministrado por Laurie. Em Yale, um quarto dos alunos da universidade se matricularam em “The Science of Well-Being”, que é como a série de aulas foi rebatizada e se chama atualmente. O nome “a ciência do bem-estar” também me atraiu. E foi assim que virei mais uma das alunas de Laurie, trancada no meu apartamento no Bairro Sumaré, isolada por causa do Coronavírus e buscando formas de manter a minha mente sã, enquanto lavava os pacotes de batata palha. Ciência e bem-estar nunca foram tão valorizados na minha vida.
O que pensamos que traz felicidade, mas não traz
O primeiro passo para aprender a ser mais feliz é desaprender. As aulas iniciais se dedicam a demonstrar, sempre a partir de experimentos sociais, que aquilo muitas vezes imaginado como capaz de nos trazer mais felicidade (ou bem-estar, os conceitos se misturam ao longo do programa) não tem esse poder. Entram no hall das metas superestimadas, mas que não têm tanto efeito na felicidade: ter boas notas na graduação, comprar coisas bonitas, ganhar na loteria e ter um corpo mais bonito.
Existe até uma palavra para designar nosso jeito de “querer errado”: MISWANTING.
Um tipo de desejo a que somos levados, porque nossa mente falha em prever com precisão os cenários futuros e o sentimento bom ou ruim advindo deles, assim como a intensidade e durabilidade desse sentimento.
No caso de notas recebidas durante a graduação, por exemplo, isso fica claro de duas formas: primeiro, notas ruins chateiam menos do que as pessoas pensam e por menos tempo. O contrário também é verdade, a alegria de tirar uma boa nota é inferior ao suposto antes de o resultado da prova sair. E costuma acabar logo.
A mente tem muitos mecanismos que servem como armadilhas na nossa busca por bem-estar. Um dos principais deles é o fato de termos nascido com alta capacidade de adaptação a coisas e circunstâncias. Ao desejar algo, entretanto, ignoramos o fato de que, caso se torne realidade, com o tempo, a tendência é que vai “perder a graça”, quando não for mais novidade.
Pausa para problematizar privilégios
Sendo um curso oferecido em uma das universidades mais importantes do mundo, é de fazer levantar a sobrancelha o tema felicidade ou bem-estar ser estudado por um grupo extremamente privilegiado. O que me chamou atenção foi que os experimentos sociais apresentados apontam, justamente, para o fato de esses privilégios não serem o principal para se ter uma vida feliz. Por exemplo, quanto ao dinheiro. Após um certo patamar, aumentar a renda pessoal não acrescenta bem-estar a uma pessoa. Já no caso de experiências, tanto uma viagem para a casa da avó quanto para um destino da última moda têm grande potencial para elevar nosso bem-estar. E em relação à conexão social, que é crucial para a felicidade, basta uma interação no metrô ou no ônibus para ela fazer efeito e melhorar nosso humor. Tudo isso, com embasamento científico.
Coisas novas alegram a vida (mas por pouco tempo)
O prazer como fruto do consumo é um dos tópicos que têm mais bibliografia recomendada. Os muitos estudos apresentados indicam algo em comum: coisas novas e bonitas até trazem felicidade, mas o problema é que ela dura pouco. Do mesmo jeito, quanto mais focada em bens materiais (ou materialista) a pessoa for, maior sua propensão a se sentir descontente.
A razão por trás da fugacidade da sensação boa que temos ao comprar algo está ligada a um conceito que vale decorar: ADAPTAÇÃO HEDÔNICA. É o padrão observado nas pessoas de regressar rapidamente a um nível de felicidade anterior à ocorrência de ium acontecimento positivo ou negativo — realizar um desejo de consumo e ganhar na loteria entram aqui. No caso da compra de uma jaqueta nova ou de um carro, a felicidade diminui, em geral, tão logo aquilo deixe de ser uma novidade.
A cilada desse sentimento é tentar reproduzi-lo e torná-lo permanente. Para isso, consome-se ainda mais coisas, que logo ficam velhas e precisam ser substituídas por outras. Obviamente não há planeta, nem bolso o suficiente para manter esse ritmo. A parte boa é que as aulas ajudam a encontrar saídas tanto para não precisar buscar alegria em bens materiais, quanto para tornar mais longa a sensação de bem-estar atrelada ao que já temos.
(Os muitos curiosos podem pular para o tópico “Como driblar as armadilhas da mente?”, mas recomendo a leitura na ordem em que o texto foi escrito, até por que deu um certo trabalho organizar tudo o que aprendi em dez semanas num post 🙂
Dieta, plástica e outras miragens
No caso de mudanças corporais, são citados dois estudos que indicam que buscar aumentar a felicidade, apostando em dietas ou cirurgias plásticas, não costuma dar certo. A cientista Sarah E. Jackson e colegas, da University College London, realizaram uma pesquisa com cerca de 2 mil indivíduos obesos.
Os pesquisadores mantiveram contato com os participantes por cerca de quatro anos durante os quais eles cumpriam um programa de dieta, tentando perder peso. Todos que iniciaram o programa pensavam que perder peso os faria felizes. Mas os dados demonstram que, na verdade, as pessoas que perderam peso ficaram mais depressivas do que as que mantiveram ou aumentaram o peso, ao fim do programa. “É como uma ilusão visual”, explica a professora Laurie (em todas as aulas do Curso, há a possibilidade de baixar um documento com a transcrição e sua fala, o que me ajuda muito na hora de colocar aspas dela aqui).
Em relação à cirurgia plástica, um estudo da Norwegian Social Research (NOVA), conduzido por Tilmann von Soest e colegas, indicou que todos os marcos negativos, de baixa autoestima até ideação suicida pioraram em adolescentes que passaram por esse procedimento estético, com o objetivo de melhorar sua imagem corporal.
Os cientistas levaram em consideração o fato de, provavelmente, jovens que estejam dispostos a se submeter a um procedimento médico para mudar seu corpo já devem estar menos felizes que os outros. Isso até era verdade, mas não de modo significativo. Em relação ao grupo de controle (adolescentes que não tinham vontade de fazer operação plástica), as métricas eram quase iguais. Foi depois da cirurgia que as medidas negativas realmente pioraram. Então, a beleza pode nos deixar mais felizes? De acordo com os estudos apresentados, não.
A comparação é o melhor hábito para quem quer ser infeliz
Na relação entre a forma física e o bem-estar é possível entender quão nociva é a nossa comparação comoutras pessoas (reais ou photoshopadas) e como o ponto de referência usado pela nossa mente pode impactar o valor que damos a nós mesmos. Enquanto passamos mais tempo na internet, nossa mente compara (queiramos ou não) os corpos de modelos e atrizes em ensaios profissionais com o nosso corpo real, dentro do qual vivemos o tempo todo, bem e mal vestidas, com e sem maquiagem, em ocasiões especiais e (ultimamente, a maior parte do tempo) usando coque e óculos no home office.
O mesmo funciona para entender a satisfação experimentada com o próprio salário. A pesquisa de Sara J. Solnicka e David Hemenway, da Universidade de Miami, revelou que metade dos entrevistados prefeririam um mundo em que tivessem 50 por cento menos renda, desde que fosse uma renda relativa alta, ou seja, ganhassem mais do que as outras pessoas ao redor.
A loucura desse dado — prefiro ganhar menos, contanto que a renda pessoal seja maior do que a do meu vizinho ou familiar — aponta para o papel central da COMPARAÇÃO SOCIAL em nossas escolhas. E infelicidades. Novamente, lembrando que vivemos numa sociedade altamente imagética e informada, o ponto referencial faz com que pessoas que passam mais tempo vendo TV se sintam mais pobres. Por quê? De novo, por contrastar sua própria realidade com a de outras pessoas, e não apenas aquelas que estão próximas, mas também todos os indústrias possíveis que tenham um perfil no Instagram. A Juliet B. Schor, economista formada em Harvard, aponta para essa relação entre gastança excessiva e sentimento de insatisfação motivada pela Claro que é besteira sentir-se mais pobre depois de ver a casa do Elon Musk, mas é assim que nossa mente costuma responder a uma imagem — por isso é importante saber como nosso cérebro funciona e driblar os mecanismos que trazem gratuitamente sentimentos ruins.
Outro estudo que demonstra o poder do ponto de referência é um clássico que demonstra a alegria maior entre atletas que ganham medalhas de bronze, quando comparados aos que ganham a medalha de prata. O artigo “When Less Is More: Counterfactual Thinking and Satisfaction Among Olympic Medalists” demonstra que, ao imaginar que poderia não ganhar medalha nenhuma, quem fica em terceiro lugar se torna mais grato, consequentemente mais feliz. Ao passo que o segundo lugar, comparando-se com o primeiro, fica infeliz por não estar no local mais alto do pódio.
Afinal, o que nos torna mais felizes?
Gratidão
E assim, chegamos a um elemento básico da felicidade. Ser grato é uma atitude (passível de ser conquistada por exercício e repetição) tão poderosa, a ponto de driblar um dos mecanismos mais incrustados na mente humana, a tal capacidade de se adaptar. Como nossa mente julga em termos relativos, em vez de absolutos, uma forma de conseguir chegar a esse estado de contentamento com o que se tem é fazer o caminho contrário, pensando de modo absoluto. O que você tem, conquistou e sente, sem usar pontos de referência externos/ilusórios. Se o medalhista de prata fizer um exercício de pensar em seu feito de modo absoluto, saberá que para sua carreira e em sua modalidade, o segundo lugar deveria ser motivo de alegria — não de lamento por ter perdido o ouro.
Mentalidade de crescimento
Acreditar que é possível melhorar suas habilidades e focar no processo, em vez de em recompensas externas, como pagamento em dinheiro e boas notas, é uma abordagem que traz mais felicidade, tanto no estudo quanto no trabalho. Com o artigo “Social Cognitive and Affective Neuroscience”, vemos que aqueles pessoas que focam nas etapas de aprendizado, não apenas na conclusão, têm mais facilidade de se recuperar dos fracassos e mais chances de ser bem-sucedido.
Dormir o suficiente e fazer exercício físico
Se fosse para fazer uma propaganda de duas coisas que realmente podem melhorar a vida de qualquer um, a professora Laurie diz que seriam: dormir e fazer exercício físico. Aquilo que já sabemos que precisa ser feito: pelo menos 30 minutos de exercício ao dia e sete ou oito horas de sono. Sem desculpas.
Conexão social
Relações com laços profundos são essenciais e contribuem até para a saúde física. Mas a importância da conexão social vai além. Estudos em cognição social e tomada de perspectiva apontam que geralmente ignoramos a importância da conexão social, mesmo que fugaz e com estranhos, para nosso bem-estar. Isso é um dos motivos do paradoxo de pessoas em grandes centros urbanos, com milhões de habitantes, sentirem-se sós com mais frequentemente do que em pequenas cidades.
Por exemplo, conversar rapidinho com alguém na fila do supermercado ou durante uma viagem de avião afeta positivamente nosso dia a dia — seja você aquela pessoa que puxa a conversa ou sua interlocutora. Uma outra experiência mostra que alguém comendo chocolate ou visitando uma exposição de arte na presença de outra pessoa — que não a está acompanhando, mas apenas dividindo o espaço com ela — tende a aproveitar melhor a experiência de comer o doce ou ver a obra de arte, do que alguém que está completamente sozinho.
Tempo vale mais que dinheiro
Com o nome autoexplicativo “Valuing time over money is associated with greater happiness”, esse é um dos vários artigos sugeridos e pesquisas apresentadas para demonstrar que ter tempo para si, inclusive para o ócio, tem um impacto positivo na felicidade superior a ter mais dinheiro.
Atos de gentileza
Atos de gentileza são grandes impulsionadores dos níveis de felicidade. Voltando ao consumo, comprar algo para outra pessoa também traz mais satisfação do que comprar algo para si mesmo. Uma experiência muito legal foi conduzida por Lara Aknin, da University of British Columbia. Ela distribuiu envelopes para quem topasse participar de um experimento. Cada um recebia 5 dólares, metade dos participantes tinham a missão de gastar o dinheiro consigo e a outra metade deveria gastar com outra pessoa ou doar para a caridade, até às cinco da tarde do mesmo dia. Posteriormente, os dois grupos receberam telefonemas da pesquisadora, e o resultado foi que quem gastou a quantia comprando alguma coisa para os outros se sentiu mais feliz.
Mais experiências, menos coisas
Mas, explicando de um jeito mais direto: em linhas gerais, experiências nos deixam mais felizes do que coisas. Gastar dinheiro com aquilo que pode ser comparado — a tal jaqueta ou o carro dos sonhos — proporciona menos bem-estar do que experiências — uma viagem ou um jantar –, que são mais difíceis de serem concretamente comparados.
No artigo “To Do or to Have? That Is the Question”, de Leaf Van Boven (University of Colorado) e Boulder Thomas Gilovich (Cornell University), a máxima da experiência sobre a coisa é reforçada. Tem a ver com a adaptação hedônica, o cuidado que temos com um telefone comprado hoje não é o mesmo do que com o telefone comprado há um ano, porque ele não é mais um símbolo de status, já nos acostumamos a ele. Ao mesmo tempo, há a questão da comparação, um iPhone 4 um dia foi um must e hoje é sucata para a maioria dos consumidores, tem a ver com nosso referencial, constantemente influenciado pelos comerciais da TV e pelos posts dos influenciadores da internet.
Já uma viagem, para dar o exemplo perfeito da categoria experiência, não se pode comparar. Mesmo que, ao tirar férias, você vá para o interior do seu estado e o seu colega vá para um deserto exótico jantar em tendas entre beduínos e passear de dromedários, sua vivência e a dele são incomparáveis. As cartas ficam embaralhadas na mente, dificultando a desvalorização de uma experiência em detrimento de outra. Ainda que a viagem do colega tenha mais charme e status, a sua ida ao interior tem nuances só suas, contam a companhia, o clima, a música que estava tocando. Cada experiência é única.
Outro motivo de experiências serem um investimento melhor, para quem visa aumentar o bem-estar, é o fato de viagens não envelhecerem como objetos. Um carro de 2021, logo será um carro com um ano, dois, três de uso. E sempre inferior ao último modelo lançado. Ao contrário, “o gozo contínuo das experiências é apenas indireto – uma memória agradável, uma autopercepção favorável ou uma história agradável para contar”. Aquele dia em que você se perdeu num país distante ou, na roça, ensinou as crianças da família a tirarem leite da vaca, afeta a narrativa da própria vida, tanto no modo como pensa sobre si, quanto como se mostra para os outros.
Mas também conta o propósito por trás da compra ou da experiência. O resumo é que perseguir status é um atalho para o mal-estar. Então, foco na via contrária. Supondo que alguém adquira uma adega, se o objetivo é resfriar adequadamente o vinho, degustá-lo e compartilhá-lo em sua temperatura ideal com outros, essa compra tende a ser uma fonte de alegria, pois é a base para experiências. Já se o esforço for no sentido de ter mais um amontoado de garrafas em casa para ostentar, de novo, o resultado pode ser efêmero — nesse ponto, já sabemos que a grama/adega do vizinho pode ser melhor e ter vinhos de uma safra mais sofisticada. Comparar-se aos outros é sofrimento certo.
Como driblar as armadilhas da mente?
“Uma mente errante é uma mente infeliz”, sentencia a professora Laurie. Para alguém como eu, que sempre gostou de ter uma mente viajante, foi um baque. Mas, lá pela terceira ou quarta semana de estudos, fez todo sentido. É o correr solto da mente que nos deixa vulneráveis a suas armadilhas: seja a tendência de fazer comparações, incluindo a partir de referenciais impossíveis de alcançar, quanto a rápida adaptação ao que quer que seja bom.
O que a ciência pode fazer para nos tornar mais felizes, afinal, é ensinar que o pensamento tem grande peso sobre nossos sentimentos. A boa notícia é que há formas de interferirmos e mudarmos a forma como pensamos.
Escrever –
Manter um estado de consciência no dia a dia, em vez de deixar a mente vagar, é uma forma de valorizar o que nos faz bem, evitar “desejar errado” (buscar bem-estar em fontes onde não encontraremos, controlar a ansiedade e a comparação. Há exercícios que ajudam a manter a mente no presente e, como é comum ao se exercitar, quanto mais praticamos, melhor ficamos nisso ou mais fácil a tarefa se torna. Há mais de um tipo de diário que podem ser escritos, desde o clássico, em que narramos o nosso dia, até o “diário da gratidão”, que tem o objetivo, como o nome indica, de manter uma lista diária de coisas pelas quais podemos agradecer. Contar os seus atos de gentileza também é uma dica, para que a sensação boa gerada por eles seja estendida. Ainda na categoria escrita, há a sugestão de uma carta de gratidão, que deve ser entregue pessoalmente a alguém que tenha sido muito importante na sua vida.
Dos meus preferidos, por comprovar cientificamente exatamente o que acredito e vivo há anos, o artigo “The Costs and Benefits of Writing, Talking, and Thinking About Life’s Triumphs and Defeats”, de Sonja Lyubomirsky e colegas, mostra que refletir (e escrever!) sobre fatos marcantes de nossa vida, sejam eles bons ou ruins, têm impacto positivo no modo como ordenamos nossas emoções e seguimos em frente, o que importante especialmente após um trauma.
Meditar –
Se a mente correndo solta e desembestada (como se diz em Minas) é um convite à ansiedade, o melhor é aprender a domar os pensamentos. Diferentes formas de meditação ajudam comprovadamente a recuperar e/ou manter a saúde mental, com benefícios também para o físico. O mindfulness é dos mais acessíveis, só baixar um aplicativo e começar. O ideal é ter sempre um mesmo lugar e horário para a prática, assim há mais chance de criar o hábito.
Um exercício proposto é o de mentalização negativa, ou seja, você se obrigar a pensar sobre algo bom que existe em sua vida, como forma de valorizá-lo mais e, consequentemente, trazer mais felicidade. Por exemplo, alguém que tem um cargo pelo qual lutou muito pode não sentir mais a alegria dos primeiros dias na nova posição. Mas imaginar como seria a vida se esse trabalho não existisse, ou se não tivesse a casa, a família, pode aumentar o contentamento.
Concentração ou flow –
Quem tem a sorte de trabalhar com o que gosta sai na frente nesse quesito — um privilégio que eu tenho, O estado de flow ou concentração profunda é altamente satisfatório, porque nos perdemos numa tarefa, a ponto de perder a noção do tempo. É um estado de mais prazer e criatividade. Quem não puder conseguir chegar a isso por meio do trabalho pode tentar com outra tarefa ou hobby, como jardinagem, pintura, escrita e o ato de cozinhar. O flow pode melhorar a vida acadêmica, profissional e pessoal.
Outra relação com as redes sociais –
Para chegar ao flow — ou a qualquer estado de mais consciência e concentração — é importante limitar as interrupções. E o que fragmenta nossa atenção mais do que a internet? Excluir as redes sociais é um conselho que pode parecer muito radical — e até fora da realidade, porque elas se tornaram também plataformas úteis para o trabalho. Para quem não vai se livrar definitivamente delas, é urgente assumir uma nova relação, limitando o tempo e, tão importante quanto, cultivando um consumo ativo de conteúdo.
Gastar o tempo simplesmente olhando para a tela do telefone, rolando o feed do Facebook ou do Instagram e deixando o que quer que apareça entrar na sua mente é um convite à infelicidade e à comparação social, que são duas faces da mesma moeda. No artigo “Comparação social, mídia social e autoestima”, pesquisadores da Universidade de Toledo revelaram que participantes de seu estudo social que mais usaram o Facebook muitas vezes tinham uma baixa autoestima e que isso era mediado por uma maior exposição a níveis superiores de comparações sociais nas redes.
Questionar o ponto de referência –
Uma mente desperta está mais apta a questionar e criticar o ponto de referência que primeiro vem a nossos pensamentos e que, tantas vezes, é capaz de gerar desprazer. Assim, quando vier uma sensação de desgosto quanto ao seu relacionamento, vale a pena questionar as razões, que podem ou não ser legítimas. Se for porque ele não é como o do casal da foto vista no Instagram ou o último episódio da série favorita, é possível descobrir a armadilha da mente, criticá-la e deixar de sentir mal em relação a isso. Na dúvida, sobretudo, fuja das comparações. Não é fácil, mas é possível.
Degustar –
Talvez a dica mais importante vinda da ciência seja aproveitar o momento. Degustar de fato uma experiência. Tentar, enquanto ainda está vivendo algo, ter consciência de quão maravilhoso é aquilo. Prestar atenção nos detalhes. Atenção é a palavra de ordem, então comer e desfrutar ao máximo da experiência, estar em família sem se preocupar com o trabalho, estar no trabalho sem se distrair com bobeiras da internet, estar presente. Um grande desafio da nossa época, mas algo imprescindível para combater o sentimento de que estamos sempre em falta. Manter um diário (mais uma vez, o benefício da escrita!) é um modo de reviver momentos agradáveis, assim como revisitar albuns de fotos. Mas é preciso tomar cuidado no último item, não vale ficar tão preocupado em fazer (e postar) boas fotos, a ponto de perder o momento.
Conhecer o poder da visibilidade e conveniência –
Não confiar na força de vontade; ela é superestimada. O melhor para criar um hábito e chegar a um objetivo é mudar situações do dia a dia, de modo a facilitar sua vida.
Exemplo:
um experimento feito com as secretárias da Cornell University mostrou que elas comiam 48% mais doces, se tivessem um pote com doces em sua mesa, em vez de a dois metros de distância. Outra fase do mesmo experimento colocou o pote noutro lugar mais próximo. Em vez de sobre a mesa, dentro da gaveta. Mesmo os doces ainda estando perto da mão, não sendo necessário levantar e se mover por dois metros para pegá-los, o simples fato de não estarem à vista significou uma redução de 25% no consumo.
Então é preciso pensar no poder da visibilidade e da conveniência para manter padrões saudáveis e ter mais felicidade. Se é comprovado que dormir e se exercitar traz bem-estar, torne isso mais fácil no dia a dia. Pode ser com gestos simples, como calçar o par de tênis logo cedo ou manter um lembrete do horário de meditar. O que captura nossa atenção tem mais chance de cooperar para a criação ou permanência de um hábito bom ou ruim.
Sobre genes e circunstâncias da vida
O trabalho de Sonja Lyubomirsky é citado para tentar entender o quanto somos pré-programados por herança genética para sermos pessoas, como Laurie Santos colocou, que veem o copo meio cheio ou meio vazio. E ainda: quanto de nossos destinos contribuem para isso. É preciso admitir que coisas terríveis acontecem frequentemente, como perder um parente para uma doença horrível ou ter o coração partido. A conclusão é um gráfico pizza da felicidade, no qual 50% é atrelado aos genes, 10% ligado à condição de vida. E os outros 40%? Podemos trabalhar neles. A professora Laurie Santos diz que “há muito movimento aí”, muito o que fazer para intensificar e tornar mais duradoura a sensação de bem-estar.
Duas críticas importantes sobre esse gráfico, que é um clássico dos estudos sociais, valem ser levadas em consideração. Eles cobrem a porcentagem do coletivo, não de um indivíduo — não significa que cada um de nós tem 40% de responsabilidade sobre a própria felicidade, obviamente não é uma ciência exata, nem um objeto de estudo tão facilmente mensurável. A ideia do 50/10/40 foi usada para fomentar a ideia de “meritocracia da felicidade”, o que é ruim, mas também contribuiu muito para o boom da psicologia positiva. E esse último fato não pode ser relevado. A conclusão, depois de estudar, assistir vídeos, responder questionários e fazer exercícios, focando na minha saúde mental e bem-estar geral, o que posso dizer é que não é tão fácil, mas parece que funciona. Caminhadas longas, menos tempo de tela e uma análise consciente de quantas coisas eu desejei e hoje tenho a meu dispor diminuem a minha ansiedade. E me deixam feliz. É algo pelo que vale a pena me esforçar.