Nascido numa família da classe trabalhadora de Liverpool, John Lennon conseguiu tornar seu sobrenome um dos mais famosos da Inglaterra e do mundo, em sua época e para sempre. Aos 29 anos, ele se casou formalmente com a artista plástica vanguardista Yoko Ono e adotou “Ono” ao fim da própria assinatura, a partir de então.
John Lennon já era John Lennon quando se apaixonou por Yoko. Um mito. Yoko, claro, também já era ela mesma e tinha 32 anos. Ele logo percebeu que, apesar de menos famosa, ela não era menos que ele em qualquer outro quesito. Foi ao ler a palavra “sim”, numa instalação de Yoko, dentro de uma galeria londrina, que o músico se interessou por ela como mulher pela primeira vez. A mulher e a artista foram indissociáveis, para ele, desde o princípio. Não havia nada a fazer, se não valorizar as obras e a trajetória que tinham feito com que ela se tornasse exatamente quem era, no momento daquele encontro que mudaria a vida dos dois. Os filmes experimentais que ela gravou, a banda experimental de que fez parte, o livro experimental que publicou (haja experimentação).
Os fãs não reagiram bem ao relacionamento. Achavam Yoko pouco para o astro. Nos jornais, diziam que era feia. Ele respondia que os dois eram um só ( igualmente bonitos ou feios, de acordo com quem olhasse, mas, essencialmente iguais). Visivelmente, se tornou mais parecido com ela, preocupado com a paz do mundo e as causas sociais. E indo mais fundo na experimentação, como aconteceu com a banda que dividiram, depois de ele deixar de fazer parte do grupo musical mais importante da história. A John Lennon/Plastic Ono Band sucedeu os Beatles e, nela como na vida, o sobrenome Lennon e Yoko estavam lado a lado, com o mesmo peso.
Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir eram parceiros de trabalho, de amor e — talvez, mais importante que tudo — de viagens. Eles correram o mundo, do Egito ao Brasil, com curiosidade genuína pela sociedade de cada país visitado, fazendo conexões dentro e fora das universidades onde eram chamados a ensinar. Em suas memórias, Simone descreve esses passeios como viagens de exploração, algo exóticas, tanto divertidas quanto cansativas.
Se o objetivo da viagem fosse o descanso, o casal preferia o interior da Itália, para onde retornavam quase todos os anos. Num deles, a novidade foi o fato de ela ter, finalmente, aprendido a dirigir. Mesmo admitindo ser uma péssima motorista, Simone quis se arriscar (e arriscar Sartre, sentando no banco do passageiro) pelas estradinhas, onde carros voavam e motoristas faziam questão de ultrapassá-la, especialmente ao perceber de que se tratava de uma mulher ao volante.
Ela ficou preocupada com a situação, com o risco de estragar o carro e, principalmente, com a opinião do companheiro. Mas, em vez de pedir a ela que diminuísse, Sartre incentivou Simone a voar pelas curvas, forçando os carros que tinham feito ultrapassagens a permitir que ela voltasse a estar na frente. “Se tivesse cedido a essas exortações, teríamos morrido cem vezes, mas eu preferia esse zelo a conselhos de prudência˜, ela escreveu sobre a reação do companheiro de viagem, sem esconder a felicidade, muito tempo depois, no livro A Força das Coisas.
Sartre, assim com John, mais famoso que sua mulher em seu tempo, nunca deu valor a esse detalhe e a viu como um par. Igualmente brilhante. E, naquela estradinha, onde ele dizia “vá, ultrapasse” — palavras que ela reproduziu tanto tempo depois, certamente, por tê-las julgado importantes — ele reconheceu Simone também como uma motorista em pé de igualdade com todos os motoristas homens do mundo. Pode parecer só um conselho irresponsável, dito numa estrada perigosa, mas é uma prova de amor.
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Lennon and Yoko on Love: animação é feita em cima das respostas do casal, em entrevistas feitas por Howard Smith entre 1969 e 1972.